07.07.2023 - A visão da Febrac sobre a reforma tributária

(monitormercantil.com.br)

Por Redação

Conversamos sobre a reforma tributária com a Federação Nacional das Empresas de Serviços de Limpeza e Conservação (Febrac), representada pelo seu advogado e consultor tributário, Igor Souza.

Tendo em vista a discussão sobre a reforma tributária, a Febrac preparou uma proposta de emenda constitucional, que ficou conhecida como PEC do Emprego, mas que ainda não deu entrada no Congresso Nacional. A Febrac possui 29 sindicatos associados com mais de 44,6 mil empresas filiadas.

O que é a PEC do Emprego?

Do ponto de vista de tributação, a PEC do Emprego consegue aumentar a base de arrecadação sem, efetivamente, aumentar a tributação em todos os setores, e ainda mantendo o pacto federativo, o que é algo muito caro para o nosso sistema tributário. Isso seria feito com dois impostos federais, um único imposto estadual e um único imposto municipal.

Os impostos federais seriam o imposto sobre a renda e o imposto digital, que muita gente confunde com a CPMF por ser um imposto sobre transações. Ocorre que a CPMF tinha uma destinação específica e não substituía outros tributos.

Essa PEC vem com a sugestão de trocar todos os tributos federais, menos o imposto sobre a renda, pelo imposto digital. Isso traria para a formalidade, praticamente, 100% das pessoas no Brasil. Todos passariam a contribuir com a tributação desde que houvesse uma transação financeira, mas em valores menores.
Os estudos que contratamos mostram que todos os setores teriam uma redução efetiva de tributação com um aumento muito grande de arrecadação. Seria uma tributação que possibilitaria arrecadar muito mais, com as pessoas pagando muito menos, e com baixa inadimplência, já que quem controlaria isso seriam os bancos através das movimentações financeiras.

Tem pessoas que dizem que esse modelo é ruim, pois o imposto digital incide sobre cascata, o que, de fato, ocorre, pois você pode ter a mesma movimentação várias vezes, mas a alíquota efetiva desse tributo sempre vai ser menor do que se tem hoje e com uma simplificação muito grande.

Outra questão é que esse modelo permite a diminuição dos encargos trabalhistas e previdenciários, que são grandes entraves para a contratação de pessoas, principalmente no setor de serviços, que demanda muita contratação de mão de obra. Esse é o setor que mais emprega no Brasil. Nós estamos falando de 10 milhões de empregos formais. Cabe ressaltar que o principal custo dessas empresas, sem exceção, é a folha.

Por exemplo, na sistemática não cumulativa que está sendo discutida, você só consegue tomar os créditos dos insumos pagos na etapa anterior. Numa empresa de mão de obra intensiva, como as grandes prestadoras de serviços, o principal insumo é a folha de salários. Como não há tomada de crédito sobre a folha, as empresas de serviços vão ter muito pouco crédito para tomar.

Isso vai gerar um aumento dos preços dos serviços que são cobrados dos consumidores. Como não há elasticidade de mercado para que os consumidores assumam esse aumento de preços, isso vai criar uma pressão para que as prestadoras de serviços tenham que achatar ainda mais suas margens, que já são muito apertadas. Isso tende a gerar um problema maior de desemprego.

Por mais que essa sistemática não onere diretamente as empresas de serviços, há uma majoração efetiva de tributação, pois está previsto um reequilíbrio da carga tributária entre setores, sem que haja um aumento no global, o risco que se corre é que essa majoração não consiga ser assumida pelo mercado.

Por exemplo, os serviços advocatícios do meu escritório vão ficar mais caros, não porque os custos aumentaram, mas porque o tributo aumentou. Se os clientes não tiverem condições de assumir esse aumento, eles vão pressionar o meu escritório. Provavelmente, eu vou ter que me adaptar a isso e assumir esse custo.

Na PEC do Emprego, nós buscamos evitar essa situação e desonerar a folha, pois quando se tem essa desoneração, se consegue contratar mais.

Como a PEC do Emprego tem sido recebida no Congresso?

A PEC ainda não existe. Ela é uma proposta que foi feita pela Febrac e que já foi apresentada para muitos parlamentares. O problema é que a primeira reação é “de novo essa CPMF?” Ficou um estigma muito grande em torno da CPMF, que foi muito contestada na época, mas que foi validada pelo Supremo e foi um sucesso de arrecadação. Existe um receio, apesar dos estudos demonstrarem que, na prática, teremos uma redução de carga tributária.

Para que a PEC seja apresentada, é necessário que um parlamentar aceite ser o autor da proposta e que haja uma quantidade mínima de parlamentares que aceitem colocá-la em estudo, discussão e votação no Congresso. A Febrac está se organizando para fazer mais apresentações, pois trata-se de uma boa alternativa ao que está sendo discutido hoje, que é um grande cheque em branco.

Tendo como referência o PIB brasileiro, o setor de serviços é dividido em sete subsetores. Qual a sua percepção sobre o sentimento das demais entidades de classe de serviços? Está havendo algum tipo de coordenação entre elas?

O setor de serviços, diferentemente da indústria e do setor financeiro, acordou tarde para os efeitos das propostas. O setor se uniu recentemente para pensar em uma proposta que o atenda como um todo. É como você disse, o setor de serviços é muito variado e engloba uma gama de prestações de serviços infinita.

Diferente da indústria, que tem uma confederação muito forte e que trabalha de forma bem unida, o setor de serviços não age assim, mas agora resolveu acordar e está fazendo um trabalho junto aos parlamentares, meio que de última hora, e que deveria ter começado antes, para demonstrar que alguns argumentos não são bem verdades, como o de que não vai haver aumento de carga tributária e de que vai haver uma redistribuição da tributação. Não é bem assim.

Todo esforço que está sendo feito é no sentido de demonstrar que é preciso de tempo para que seja feita uma reflexão um pouco maior e que é necessário fazer ajustes no que está aí, caso a intenção seja continuar com essa proposta e não haja a possibilidade de abertura de algo novo.

Na visão da entidade, quais deverão ser os impactos sobre a mão de obra contratada pelo setor de serviços?

Uma pessoa pode ser contratada por uma empresa como funcionário ou via Pessoa Jurídica (PJ) para prestar um serviço. Existe uma lei que admite a contratação por PJ, e o Supremo já a validou como constitucional (Lei 13.429/2017). Se uma empresa contrata alguém como PJ, ela tem o crédito do PIS/Cofins sobre a sua nota. Se ela contrata como funcionário, ela não tem esse crédito, além de pagar mais 20% sobre o salário. Apesar de ser um insumo, o funcionário não é considerado como um insumo.

Há um risco forte de pejotização. Esse já é um setor pressionado, como, por exemplo, o seu setor, o jornalístico. Quando saiu a lei da pejotização, o pessoal brincou que era a “Lei Rede Globo”. Esse setor já trabalha muito assim, mas essa não é a realidade de todos os setores de prestação de serviços. Imagine se os maiores contratantes de prestação de serviços começarem a fazer isso. Vai virar o país da pejotização.

No caso da Febrac, um faxineiro não vai ser PJ, mas, talvez, o seu gerente seja. Se nós estamos falando de 10 milhões de empregos formais, talvez nós estejamos falando de 500 mil a 1 milhão de empregos que vão virar PJ. Essa é uma tendência. Não é ilegal, mas se vai tirando direitos dos trabalhadores. Ninguém quer isso, mas pode ser que aconteça como forma de minimizar o impacto do aumento da tributação que vai existir.

Tanto a PEC 45/2019 e a PEC 110/2019 estão desde 2019 no Congresso sem que tivessem avançado. Agora, engataram a primeira e estão tratorando tudo. Na sua visão, por que isso está acontecendo?

Existe uma necessidade real de uma reforma tributária. O governo está precisando arrecadar, pois está havendo um aumento de despesas da máquina, e tem pressionado o Congresso para que ele faça uma reforma. O problema é que quem está representando o governo é o Bernard Appy, um dos autores da PEC 45/2019. Para ele, esse é o melhor projeto que existe e esse é o momento propício para fazê-lo andar.

Do ponto de vista político do governo, é melhor fazer a reforma no primeiro ano. Não é um absurdo falar que a reforma tributária será feita, mas é preciso de mais discussão e um olhar mais atento para a questão dos serviços, que é o setor que mais emprega no país, mas que estava sendo alijado. Existe uma sensibilidade, que não é verdadeira, de que o setor de serviços é o que menos paga impostos.

A indústria paga o PIS/Cofins, IPI e ICMS. O setor de serviços paga PIS/Cofins e o ISS. Só que o ICMS e o IPI são não cumulativos, enquanto o ISS é cumulativo. Além disso, o setor de serviços paga toda a tributação sobre a folha. Os outros setores também pagam, mas esse custo não é tão relevante. Quando se coloca isso na balança, não é verdade que o setor de serviços paga menos impostos.

As pessoas estão começando a perceber isso agora, tanto que o deputado Aguinaldo Ribeiro colocou no final do substitutivo que na próxima fase da reforma tributária será falado de imposto de renda e que se, de fato, a tributação efetiva do setor de serviços for muito elevada, será preciso pensar numa forma de redução mediante a desoneração de folha.

Depois de muitas conversas, ele percebeu essa questão. Ele não quer desmontar o projeto, mas quer jogar essa questão para uma próxima fase, só que isso é assinar um cheque em branco. Como se vai jogar para a próxima fase se não se sabe o que vai acontecer?

Quando houve a mudança da PIS/Cofins de cumulativo para não cumulativo, a alíquota conjunta dos dois tributos subiu de 3,65% para 9,25%. Trata-se de uma alíquota elevada, mas como se falava que não era cumulativa, então ia se tomar crédito.

Quando se perguntou como isso seria feito, disseram que isso seria visto na próxima fase. O que aconteceu quando se chegou na próxima fase? Não deram crédito sobre a folha, e o setor de serviços teve um aumento absurdo de tributação. Muitas empresas quebraram por causa disso.

Por exemplo, os maiores contratantes de serviços hoje no Brasil são os governos federal, estaduais e municipais. Quando há um aumento de tributação, o contratado pode pedir um equilíbrio contratual. Esse processo, que poderia ser muito rápido, às vezes demora anos para se que consiga a autorização do reequilíbrio. Até lá, muitas empresas já quebraram. Quando nós falamos com o deputado Aguinaldo sobre isso, eles nos disse que podemos pedir o reequilíbrio. Não é assim.

Como disse, isso aconteceu na PIS/Cofins. Muitas empresas quebraram ou estão superendividadas até hoje porque não conseguem quitar essa conta em função de uma situação similar a essa. Tudo isso tem que ser pensado antes de se implementar uma reforma. A teoria é uma coisa, e a prática, outra. Está faltando visão prática e pragmática por parte dos teóricos que criaram essa proposta.

Esse assunto está sendo devidamente discutido?

Todo mundo sabe que o sistema tributário precisa mudar e ser simplificado, mas isso não pode ser feito de uma forma açodada e sem uma discussão maior com todos os setores e com a sociedade. Recentemente, a Febrac soltou uma nota nos jornais pedindo justamente isso junto com a União Geral dos Trabalhadores (UGT), que é uma central sindical dos trabalhadores.

Essa foi a primeira vez que os trabalhadores foram chamados para se manifestar. Não é um empresário reclamando à toa ou a turma da lamentação, como estão dizendo por aí. De fato, é preciso um estudo mais profundo.

Se você pedir para as equipes do Appy e do Fernando Haddad os dados econômicos sobre os efeitos da proposta, eles não apresentam. Eu acho que eles não apresentam porque não sabem, exatamente, o que vai acontecer.

Veja que interessante. O governo fala que a reforma não vai onerar, que o sistema é não cumulativo, que tributa por fora e que as reclamações são à toa. Mas no caso do agronegócio, a alíquota vai ser pela metade. Para o setor financeiro, a alíquota vai ser pela metade. Para o setor de educação, a alíquota vai ser pela metade. Para o setor de saúde, a alíquota vai ser pela metade. Mas por que vai ser pela metade se ninguém sabe qual é a alíquota nominal?

O pessoal está comemorando uma alíquota pela metade que pode virar 50%, pois ninguém sabe do que se está falando. Quando se pergunta para o relator porque a alíquota é pela metade, ele diz que vai aumentar a cesta básica, o spread bancário e os custos de educação e de saúde. Então ele está admitindo que essa nova modalidade vai trazer um aumento de tributação. Quando isso é questionado, o pessoal se engasga. É óbvio que vai trazer um aumento.

Recentemente, o Appy reconheceu, com outras palavras, que vai haver um aumento de tributação. Talvez não para o empresário de forma direta, mas para a sociedade como um todo. Pode ser que o empresário tenha que assumir isso, pois pode ser que a sociedade não tenha capacidade para isso. Essa questão, que precisa ser aprofundada, é econômica, e não jurídica. Ninguém tem os dados de forma exata hoje. Se essa PEC passar, será um grande cheque em branco.

Temos outra coisa estranha. Vem uma série de associações que dizem que as suas tributações vão aumentar em 170%, 55% ou 30%, mas ninguém sabe de onde estão vindo esses números. Nas simulações que eu faço, ninguém chega num aumento de 170%. Pode ser que alguém esteja vendo isso, mas nós não vemos isso acontecer. Nós vemos aumentos relevantes de custos tributários de 20%, 30%, 35%, que os setores terão que repassar, mas não há a certeza de que eles vão conseguir repassá-los.

Recentemente, a OAB mandou um manifesto para o Governo Federal fazendo pleitos da classe. Ela está pedindo para que se coloque na emenda a garantia de repasse ao consumidor do aumento da tributação dos serviços jurídicos. Isso é um absurdo, pois vai totalmente contra ao que é uma economia de mercado, mas esse é um receio que o setor está passando.

Nós estamos num momento de uma relativa dificuldade econômica. Você trazer, no meio disso, uma tributação maior, sem uma garantia de que você vai poder repassar, pode prejudicar muito classes como a dos advogados, dos médicos e dos jornalistas, enfim, todo mundo que presta serviços.

Caso esse projeto seja aprovado na Câmara, ele seguirá para o Senado. Antes de lhe fazer a pergunta, vou relembrar o caso do PL 2337/2021, que reformava o imposto de renda, passando a tributar, inclusive, os dividendos. Esse projeto foi aprovado às pressas pela Câmara, e sem a devida discussão, mas quando chegou ao Senado, nem foi apreciado, tanto que está parado até hoje numa gaveta. Caso a reforma tributária seja aprovada pela Câmara, o que deve acontecer no Senado?

Eu não tenho uma visão clara sobre isso, mas tenho a impressão de que o apoio do governo no Senado é mais restrito. Lá, a batalha será um pouco mais dura. O relator da reforma tributária na casa, senador Efraim Filho, já disse que no Senado não passa nenhum projeto que implique em aumento de arrecadação. Se de fato ele for rigoroso no cumprimento do que ele tem declarado, ele não aprova esse projeto do jeito que está. Contudo, nós não temos o termômetro adequado para dizer se passa ou não.

Fonte: https://monitormercantil.com.br/a-visao-da-febrac-sobre-a-reforma-tributaria/

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